No tempo em que os evangelhos começaram a ser escritos (depois de 70 EC) é provável que os judeus da diáspora - aqueles que viviam muito longe da Palestina - olhassem para a Galileia como um local de pessoas livres, por a Galileia ter sido o berço de algumas revoltas inspiradoras (por exemplo, a revolta de Judas Galileu).
Por outro lado, Jerusalém não seria vista com os mesmos bons olhos. Jerusalém situava-se na Judeia, um território ocupado e governado diretamente pelos romanos desde 6 EC. O Templo seria talvez a única instituição que alegava preservar a identidade dos judeus, mas era visto como um foco de corrupção e de ganância.
A Galileia demorou mais tempo até ser governada diretamente por Roma. Herodes Antipas governou a Galileia de 4 AEC até 39 EC, sendo sucedido por Agripa I e Agripa II. Apesar de estes governadores herodianos serem obedientes a Roma, os habitantes da Galileia teriam talvez o sentimento de ter a sua identidade de alguma forma preservada.
Em 66 EC uma guerra de independência deflagra na Judeia e na Galileia. A disputa pelo Templo de Jerusalém (a maior fonte de riqueza da Judeia) levou a que a guerra de independência passasse a guerra civil, um fraticídio de judeus contra judeus. Muitos morreram nos combates entre os vários grupos rivais judaicos.
É provável, então, que Jerusalém fosse olhada com horror até pelos próprios judeus. Por outro lado, a Galileia seria olhada como um local onde as pessoas nãa tinham sido tocadas pela cobiça gerada pelos negócios do Templo.
Daí os evangelhos retratam Jesus recrutando apóstolos na Galileia. Jerusalém com o seu Templo era uma fonte de vergonha para os judeus no tempo em que os evangelhos começam a ser escritos - imediatamente a seguir à guerra que levou à destruição de Jerusalém.
O pós-ressurreição nos Evangelhos
Em todo o evangelho de Marcos, Jesus só passa uns dias em Jerusalém - os seus últimos dias. As mulheres que foram visitar o seu túmulo, são abordadas por um jovem que lhes diz que Jesus se dirigiu de volta à Galileia.
Marcos 16:7 Mas ide, dizei a seus discípulos, e a Pedro, que ele vai adiante de vós para a Galiléia; ali o vereis, como ele vos disse.
Em Mateus, encontramos narrativa semelhante, mas desta vez é o próprio Jesus que fala às mulheres.
Mateus 28:10 Então Jesus disse-lhes: Não temais; ide dizer a meus irmãos que vão à Galiléia, e lá me verão.
E os discípulos regressam à Galileia para ver Jesus novamente.
Mateus 28:16,17 E os onze discípulos partiram para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes tinha designado. E, quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram.
O autor de Lucas já não teria assim tanto horror a Jerusalém, pois teria escrito numa data em que as atrocidades cometidas em Jerusalém já teriam passado ao esquecimento. Depois de ressuscitar, Jesus encontra-se com dois discípulos que caminhavam de Jerusalém para Emaus. Depois deste encontro, estes discípulos retornam a Jerusalém e juntam-se aos onze apóstolos que lá permaneciam.
Lucas 24:33-34 E na mesma hora, levantando-se, tornaram para Jerusalém, e acharam congregados os onze, e os que estavam com eles, os quais diziam: "Ressuscitou verdadeiramente o Senhor, e já apareceu a Simão."
Pouco mais tarde, Jesus junta-se também aos onze apóstolos e diz para todos permanecerem em Jerusalém.
Lucas 24:49 E eis que sobre vós envio a promessa de meu Pai; ficai, porém, na cidade de Jerusalém, até que do alto sejais revestidos de poder.
Em João 20 Jesus aparece aos discípulos em Jerusalém. Primeiro revela-se a Maria Madalena, junto ao próprio sepulcro, e depois aos onze apóstolos que se encontravam fechados numa casa.
Em João 21, um claro acrescento ao evangelho de João, Jesus participa com os apóstolos numa pescaria na Galileia.
É curioso que Pedro estava nu e vestiu-se para, logo de seguida, lançar-se ao mar.
João 21:7 Então aquele discípulo, a quem Jesus amava, disse a Pedro: É o Senhor. E, quando Simão Pedro ouviu que era o Senhor, cingiu-se com a túnica (porque estava nu) e lançou-se ao mar.