Bodas de Caná
Que podemos dizer sobre a famosa festa de
casamento onde Jesus transforma água em vinho?
João 2:1-11 Três dias depois, houve um casamento em Caná da Galiléia, e estava ali a mãe de Jesus; e foi também convidado Jesus com seus discípulos para o casamento. E, tendo acabado o vinho, a mãe de Jesus lhe disse: Eles não têm vinho. Respondeu-lhes Jesus: Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada a minha hora. Disse então sua mãe aos serventes: Fazei tudo quanto ele vos disser. Ora, estavam ali postas seis talhas de pedra, para as purificações dos judeus, e em cada uma cabiam duas ou três metretas. Ordenou-lhe Jesus: Enchei de água essas talhas. E encheram-nas até em cima. Então lhes disse: Tirai agora, e levai ao mestre-sala. E eles o fizeram. Quando o mestre-sala provou a água tornada em vinho, não sabendo donde era, se bem que o sabiam os serventes que tinham tirado a água, chamou o mestre-sala ao noivo e lhe disse: Todo homem põe primeiro o vinho bom e, quando já têm bebido bem, então o inferior; mas tu guardaste até agora o bom vinho. Assim deu Jesus início aos seus sinais em Caná da Galiléia, e manifestou a sua glória; e os seus discípulos creram nele.
Muitas questões se poderiam colocar acerca deste episódio:
-
Porque
é que Maria fica preocupada com a falta de vinho? Segundo o mestre-sala, os
convidados já tinham “bebido bem”!
-
Porque
é que Jesus responde à sua mãe com palavras tão ríspidas (“que tenho eu
contigo, mulher”)?
-
Porque
é que Maria tinha poder para dar ordens aos servos da festa? Faria parte da
organização do evento?
-
Quem
viu Jesus a transformar a água em vinho? O texto sugere que apenas os servos
poderiam assegurar que as talhas tinham água. Foi Maria que os obrigou a
dizerem isso?
-
Quem
tomou conhecimento do prodígio de Jesus? Todos os convidados da boda ou apenas
os discípulos que vieram com Jesus ao casamento?
Judeus
No Evangelho Segundo
João é impressionante a quantidade de vezes que é utilizada a palavra
“judeu” para designar intervenientes na narrativa. Muitas personagens anónimas são
referidas com a designação genérica de “judeu”. Podemos encontrar em João mais de sessenta referências com a
palavra “judeu”.
João 1:19-20 E este foi o testemunho de João, quando os judeus lhe enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para que lhe perguntassem: Quem és tu? Ele, pois, confessou e não negou; sim, confessou: Eu não sou o Cristo.
João 2:6 Ora, estavam ali postas seis talhas de pedra, para as purificações dos judeus, e em cada uma cabiam duas ou três medidas.
João 2:13 Estando próxima a páscoa dos judeus, Jesus subiu a Jerusalém.
João 5:10 Pelo que disseram os judeus ao que fora curado: Hoje é sábado, e não te é lícito carregar o leito.
João 5:14-18 .... Retirou-se, então, o homem, e contou aos judeus que era Jesus quem o curara. Por isso os judeus perseguiram a Jesus, porque fazia estas coisas no sábado. Mas Jesus lhes respondeu: Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também. Por isso, pois, os judeus ainda mais procuravam matá-lo, ...
...
No contexto dos evangelhos este abuso da designação “judeu”
torna-se um absurdo. Ainda mais absurdo de torna quando algumas das passagens
ocorrem na Judeia, a pátria dos judeus! (seria a mesma coisa que escrever-se a
biografia do rei Dom Carlos com frases do género “... certo dia, estando o rei
Dom Carlos em Sintra, disse-lhe um português...” ou “... ia o rei Dom Carlos de viagem para Lisboa
quando alguns portugueses aproximaram-se para disparar sobre ele...”).
Em muitas destas passagens, os judeus são difamados e
apresentados como pessoas detestáveis:
João 7:1 Depois disto andava Jesus pela Galiléia; pois não queria andar pela Judeia, porque os judeus procuravam matá-lo.
João 7:11-13 Ora, os judeus o procuravam na festa, e perguntavam: Onde está ele? ... Todavia ninguém falava dele abertamente, por medo dos judeus.
João 8:48-52 Responderam-lhe os judeus: Não dizemos com razão que és samaritano, e que tens demônio? ... Disseram-lhe os judeus: Agora sabemos que tens demônios. ...
João 9:22 Isso disseram seus pais, porque temiam os judeus, porquanto já tinham estes combinado que se alguém confessasse ser Jesus o Cristo, fosse expulso da sinagoga.
João 10:31 Os judeus pegaram então outra vez em pedras para o apedrejar.
Para reforçar este afastamento do judaísmo, em algumas
passagens de João, Jesus faz questão
de se demarcar da raça dos judeus quando fala sobre os antepassados destes:
João 6:49 Vossos pais comeram o maná no deserto e morreram.
João 6:58 Este é o pão que desceu do céu; não é como o caso de vossos pais, que comeram o maná e morreram; quem comer este pão viverá para sempre.
Como Jesus diz “vossos antepassados” (ou “vossos pais”), não
se inclui nessa linhagem. Isto contraria as genealogias de Mateus e Lucas onde se
declara que Jesus era descendente do rei David, o que implicaria Jesus ser
judeu.
Discípulo amado
O autor de João menciona ao longo do texto um “discípulo que
Jesus amava”, como sendo uma personagem especial.
João 13:23-25 Ora, achava-se reclinado sobre o peito de Jesus um de seus discípulos, aquele a quem Jesus amava. A esse, pois, fez Simão Pedro sinal, e lhe pediu: Pergunta-lhe de quem é que fala. Aquele discípulo, recostando-se assim ao peito de Jesus, perguntou-lhe: Senhor, quem é?
João 19:26-27 Ora, Jesus, vendo ali sua mãe, e ao lado dela o discípulo a quem ele amava, disse a sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho. Então disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E desde aquela hora o discípulo a recebeu em sua casa.
João 20:1-2 No primeiro dia da semana Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu que a pedra fora removida do sepulcro. Correu, pois, e foi ter com Simão Pedro, e o outro discípulo, a quem Jesus amava, e disse-lhes: Tiraram do sepulcro o Senhor, e não sabemos onde o puseram.
João 21:7 Então aquele discípulo a quem Jesus amava disse a Pedro: Senhor. Quando, pois, Simão Pedro ouviu que era o Senhor, cingiu-se com a túnica, porque estava despido, e lançou-se ao mar;
João 21:20-22 E Pedro, virando-se, viu que o seguia aquele discípulo a quem Jesus amava, ... Ora, vendo Pedro a este, perguntou a Jesus: Senhor, e deste que será? Respondeu-lhe Jesus: Se eu quiser que ele fique até que eu venha, que tens tu com isso? Segue-me tu. ...
Que podemos saber acerca deste “discípulo amado”:
-
durante
a última ceia, esteve deitado sobre o peito de Jesus;
-
esteve
a falar com Jesus junto à cruz e foi viver com a mãe de Jesus depois de ele
morrer;
-
recebeu,
de Maria Madalena, a notícia que o corpo de Jesus tinha desaparecido do
sepulcro;
-
estava
com Pedro num barco, quando o ressuscitado Jesus apareceu-lhes (incidentalmente
Pedro estava despido e vestiu-se para nadar!... mas... é só um pormenor...);
-
Pedro
pergunta a Jesus qual o futuro deste “discípulo amado”.
Só no desfecho do livro é que o autor identifica-se como
sendo este “discípulo amado”.
João 21:24 Este é o discípulo que dá testemunho destas coisas e as escreveu; e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro.
Mas este discípulo permanece sempre misteriosamente anónimo.
Para descobrirmos de quem se trata poderemos usar o raciocínio lógico e começar
por analisar o seguinte texto:
João 19:25-27 Estavam em pé, junto à cruz de Jesus, sua mãe, e a irmã de sua mãe, e Maria, mulher de Clôpas, e Maria Madalena. Ora, Jesus, vendo ali sua mãe, e ao lado dela o discípulo a quem ele amava, disse a sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho. Então disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E desde aquela hora o discípulo a recebeu em sua casa.
Ora, lendo a primeira frase, verificamos que, perto da cruz,
estavam:
-
a mãe
de Jesus;
-
uma tia
de Jesus;
-
a
Maria, mulher de Clopas;
-
a Maria
Madalena.
Mas, na frase
imediatamente a seguir temos Jesus a conversar com a sua mãe e com o “discípulo
amado”. Por exclusão de partes, o “discípulo amado” teria de ser uma das
seguintes mulheres:
-
a tia
de Jesus;
-
ou a
Maria, mulher de Clopas;
-
ou a
Maria Madalena.
Mas, agora, para limitar o nossa lista de candidatas a
“discípulo amado”, vamos eliminar mais uma pessoa da lista (quem será?... será
a Maria?...). Vejamos o seguinte texto:
João 20:1-2 No primeiro dia da semana Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu que a pedra fora removida do sepulcro. Correu, pois, e foi ter com Simão Pedro, e o outro discípulo, a quem Jesus amava, e disse-lhes: Tiraram do sepulcro o Senhor, e não sabemos onde o puseram.
Os fãs do Código Da
Vinci de Dan Brown vão ficar desapontados, mas somos obrigados a eliminar
Maria Madalena da lista dos candidados a “discípulo amado”, porque existe uma
passagem onde Maria Madalena contracena com o “discípulo amado” (João 20:1-2). Teremos,
então, uma final com as seguintes concorrentes:
-
a tia
de Jesus;
-
ou a Maria,
mulher de Clopas.
Eliminemos, agora, a tia de Jesus, porque não é mencionada
em mais nenhum relato, e ficamos com a grande vencedora deste concurso:
-
Maria,
mulher de Clopas.
Isto sim, faz sentido! Uma mulher casada teria de manter o
anonimato. Não poderia divulgar o seu nome num livro onde declara ter-se
deitado no peito de outro homem (mesmo que tenha sido o peito de um deus) e que
tinha estado num barco com um homem despido!
Infelizmente, como o livro de João tem muito pouca consistência, não podemos tirar um real
proveito do exercício de lógica que acabámos de realizar.
Nós não somos filhos daquelas ...
Durante uma longa discussão com judeus, estes respondem a
Jesus que não são filhos de prostitutas.
João 8:39-41 Responderam-lhe: Nosso pai é Abraão. Disse-lhes Jesus: Se sois filhos de Abraão, fazei as obras de Abraão. Mas agora procurais matar-me, a mim que vos falei a verdade que de Deus ouvi; isso Abraão não fez. Vós fazeis as obras de vosso pai. Replicaram-lhe eles: Nós não somos nascidos de prostituição; temos um Pai, que é Deus.
Ora, uma resposta deste tipo implicaria um entre os dois
seguintes pressupostos:
-
Jesus
teria, em primeiro lugar, chamado filhos de prostitutas aos seus interlocutores,
ou pelo menos teria insinuado isso de alguma forma – mas no texto não se
encontra nada disso;
-
os
judeus queriam insinuar que eram melhores do que Jesus por não serem filhos de
prostitutas – e esta hipótese levaria a reflexões que seriam demasiado chocantes
para serem consideradas.
O que dá a entender é que a resposta está completamente fora
de contexto, como se dissessem uma coisa do género “porque é que temos de estar
aqui a falar com este, se nós não somos filhos de prostitutas?”, terminando
abruptamente a linha de raciocínio. De qualquer modo, esta longa discussão
acaba numa tentativa de apedrejamento de Jesus (João 8:59).
Não me toques, toca-me
Quando Maria Madalena viu Jesus ressuscitado, Jesus não
permitiu que ela o tocasse, argumentando “ainda não subi ao Pai”:
João 20:16-17 Disse-lhe Jesus: Maria! Ela, virando-se, disse-lhe em hebraico: Raboni! - que quer dizer, Mestre. Disse-lhe Jesus: Deixa de me tocar, porque ainda não subi ao Pai; mas vai a meus irmãos e dize-lhes que eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus.
Mas, poucos versículos à frente, vemos Jesus a insistir para
Tomé tocar nas cicatrizes provocadas pela crucificação:
João 20:26-27 Oito dias depois estavam os discípulos outra vez ali reunidos, e Tomé com eles. Chegou Jesus, estando as portas fechadas, pôs-se no meio deles e disse: Paz seja convosco. Depois disse a Tomé: Chega aqui o teu dedo, e vê as minhas mãos; chega a tua mão, e mete-a no meu lado; e não mais sejas incrédulo, mas crente.
Jesus fez muitas coisas
No 2º fecho do livro de João,
o autor afirma que se todas as coisas que Jesus fez fossem registadas em
livros, estes não caberiam no mundo:
João 21:25 E ainda muitas outras coisas há que Jesus fez; as quais, se fossem escritas uma por uma, creio que nem ainda no mundo inteiro caberiam os livros que se escrevessem.
No entanto, o autor do livro de Actos, diz que escreveu sobre “todas as coisas que Jesus fez”:
Actos 1:1 Fiz o primeiro tratado, ó Teófilo, acerca de tudo quanto Jesus começou a fazer e ensinar, ...
Será que o autor de Actos
encheu “o mundo inteiro” de livros para escrever tudo o que Jesus fez?