domingo, 25 de maio de 2014

Século II - Actos - Quem Roubou o Corpo?




Quem lê os evangelhos até ao fim fica com a sugestão de que a narrativa acaba abruptamente e que deveria ter uma continuação. Os evangelhos terminam do seguinte modo:
 - o corpo de Jesus desaparece do túmulo;
 - a alguns (muito poucos) é revelado que a razão do desaparecimento do corpo de Jesus foi a sua ressurreição;
 - todos as outras pessoas, incluindo as autoridades, ficam sem saber o que realmente se passou: se Jesus sobreviveu e fugiu do túmulo; se os discípulos roubaram o corpo; etc

Entretanto, no século II, alguém escreveu o livro Actos dos Apóstolos como uma continuação dos evangelhos. Em particular entende-se este livro como uma continuação do Evangelho Segundo Lucas.

Uma vez que estende a narrativa a partir do ponto onde terminam os evangelhos, seria de esperar que Actos dos Apóstolos começasse com o relato de uma caça ao homem por parte das autoridades de Jerusalém. Isto, por dois motivos:
 - se Jesus fugiu do túmulo (p.ex. tendo sobrevivido aos ferimentos da crucificação), as autoridades deveriam querer organizar uma perseguição para caçar Jesus;
 - se o corpo foi roubado, as autoridades deveriam querer apanhar quem roubou o corpo.

Mas nada disso acontece em Actos dos Apóstolos. Não existe nenhuma autoridade preocupada com o desaparecimento do corpo de Jesus! Vejamos uma síntese dos primeiros capítulos de Actos:
Capítulo 1: Jesus ascende aos céus e um número não especificado de discípulos observa o evento, em Jesrusalém, no exacto local onde estavam as autoridades que levaram à execução de Jesus e que deveriam estar preocupadas com o desaparecimento do corpo; onde estava Pilatos, agora?
Capítulo 2: Pedro e outros discípulos reúnem-se calmamente em Jerusalém, poucos dias depois da morte de Jesus; são apenas levemente acusados de estarem bêbados; 
Capítulo 3 e 4: Pedro e João são presos por pregarem em público mas nada sobre o desaparecimento do corpo de Jesus - ninguém lhes pergunta onde estaria o corpo!  
Capítulo 5: Pedro comporta-se já como um tirano religioso: acusa um casal de não pagarem suficiente dízimo à congregação; tanto o homem como a mulher morrem magicamente.  Pedro e outros são presos - por pregarem publicamente - e novamente soltos.  
Capitulo 6 e 7: Estêvão é preso e julgado; em sua defesa, faz um longo discurso onde sintetiza o Antigo Testamento. Nem sequer fala sobre Jesus.


A hipótese de Jesus sobreviver aos ferimentos causados pela crucificação não seria descabido na medida em que, segundo os evangelhos, Jesus permaneceu na cruz apenas algumas horas, e é possível sobreviver-se mais tempo do que isso crucificado (dependendo da saúde do supliciado e outros factores, ver http://en.wikipedia.org/wiki/Crucifixion).

O que é descabido é ver nas histórias de Actos dos Apóstolos um total desinteresse de todos os personagens não crentes pelo assunto do desaparecimento de Jesus.