A tradição atribuiu para este livro a autoria de Lucas, um
médico amigo do (auto-proclamado) apóstolo Paulo. Os defensores desta tradição
tentam reforçar esta ideia “encontrando” no texto provas de que o autor seria
médico, mas as passagens simplesmente revelam que o autor seria dotado de uma sólida
cultura geral.
O nome “Lucas” é referenciado por três vezes em diferentes
cartas de Paulo, mas não há nada que garanta que estas três referências dizem
respeito ao mesmo homem, porque não pormenorizam detalhes. Uma das passagens
caracteriza Lucas como “médico amado” e as outras apenas listam o nome entre
outros.
Colossenses 4:10-14 Saúda-vos Aristarco, meu companheiro de prisão, e Marcos, o primo de Barnabé (a respeito do qual recebestes instruções; se for ter convosco, recebei-o), ... Saúda-vos Lucas, o médico amado, e Demas.
2 Timóteo 4:11 só Lucas está comigo. Toma a Marcos e traze-o contigo, porque me é muito útil para o ministério.
Filemón 1:24 assim como Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus cooperadores.
Podemos ver que em todas as referências que Paulo faz de
Lucas também faz referência a uma pessoa com o nome de Marcos que, por sua vez,
a tradição atribui a autoria do Evangelho
Segundo Marcos. Se a tradição estiver correcta temos pelo menos dois
evangelhos ligados quase directamente a Paulo, o qual declarou nunca ter conhecido
Jesus em carne, mas apenas através de visões (Gálatas 1:11-12).
Lucas tem 1149
versículos, 320 dos quais poderão ter sido inspirados em Marcos. Segundo a teoria da “Dupla Fonte” o seu autor verteu cerca
de metade do conteúdo de Marcos para o seu próprio relato. Baseou o resto do
texto noutras fontes como o Evangelho
Perdido Q e outras.
Podemos identificar uma série de omissões relativamente a
Marcos, e uma delas é um bloco considerável. Vamos explorar mais adiante, uma
teoria que sustenta que “Lucas” teve como fonte uma cópia danificada de Marcos,
de onde teria sido subtraído um bloco de texto que é chamado de “grande omissão
de Lucas”.
Data e local de escrita
O Evangelho Segundo
Lucas, não fornece internamente nenhuma pista sobre qual a data de sua
escrita. Mas, segundo a teoria da “Dupla Fonte”, esta obra foi escrita depois
de Marcos, digamos que depois de 70
EC, e como limite superior temos os registos históricos sobre Marcion de Sínope,
que, por volta de 150 EC, propôs este evangelho como o único aceitável para
fazer parte de um cânon de escrituras
cristãs, em conjunto com dez cartas de Paulo.
Quanto ao local, temos de recorrer ao livro dos Actos, assumindo que foi escrito pelo
mesmo autor. Podemos encontrar, neste livro, muitas referências a locais da
Macedónia e relatos de episódios que aí decorreram. Em particular, vemos que o
autor descreve demoradamente a cidade de Filipos e episódios aí decorridos, apesar
de explicar que Paulo e seus companheiros só lá permaneceram uns poucos dias. A
cidade de Filipos é declarada como a cidade principal da Macedónia (Actos
16:12) mas, historicamente, a capital era Tessalónica. Isto provavelmente significa
que, na percepção do autor, Filipos seria uma cidade importante.
Actos 16:12 e dali para Filipos, que é a primeira cidade desse distrito da Macedônia, e colônia romana; e estivemos alguns dias nessa cidade.
Com alguma probabilidade, o autor de Lucas e Actos seria de
Filipos ou de outra localidade da Macedónia e estaria a escrever para uma
audiência mista de gregos (helenicos) e romanos. No livro dos Actos também é evidente que o autor era,
ou pretendia ser, um dos companheiros de Paulo, porque muitas passagens sobre Paulo
são narradas na primeira pessoa (do plural, “nós”), mas não podemos concluir
que o autor seria “Lucas, o médico amado”, pois há mais companheiros de Paulo
que são listados.
Estilo e doutrina
O seu autor, que é provavelmente o autor do livro dos Actos dos Apóstolos, utilizou um estilo
literário elaborado, como o encontrado em biografias de personagens históricas.
Lucas 1:1-3 Visto que muitos têm empreendido fazer uma narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram, segundo no-los transmitiram os que desde o princípio foram testemunhas oculares e ministros da palavra, também a mim, depois de haver investido tudo cuidadosamente desde o começo, pareceu-me bem, ó excelentíssimo Teófilo, escrever-te uma narração em ordem.
Com esta introdução ficamos a saber que:
-
o autor
não foi o primeiro a escrever um relato sobre o evangelho;
-
o autor
já conhecia muitas outras narrativas;
-
o autor
não se declara testemunha dos factos, mas antes indica que baseia-se em
testemunhos;
Na introdução de Lucas
e de Actos, o autor dá a entender que
está a escrever para um homem chamado Teófilo (Lucas 1:3 “... pareceu-me bem, ó
excelentíssimo Teófilo, escrever-te uma narração...”; Actos 1:1 “Fiz o primeiro
tratado, ó Teófilo...”) e não para uma audiência alargada. Este Teófilo poderia
ser realmente um homem, por exemplo um patrocinador do escritor que teria
encomendado a “Lucas” um relato elaborado. Mas, por outro lado, “Teófilo” em
grego significa “amigo de Deus”, o que poderia significar uma audiência
alargada. A procura de solução para ambiguidades como esta fazem da leitura da
Bíblia um trabalho obrigatório de investigação.
“Lucas” frequentemente fala do Espírito Santo, 13 vezes no
evangelho e 41 vezes no livro Actos dos
Apóstolos. Marcos, Mateus e João raramente mencionam.
Os relatos sobre a Anunciação e o nascimento a partir de uma
virgem terão sido inseridos posteriormente para acrescentar mistério à crença
em Jesus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário