domingo, 24 de maio de 2015

Assírios e Babilónios (Parte 3) - Do Egipto à Síria





Legenda:

-          reis de Judá;
-          reis de Israel;
-          reis da Síria.



Jeroboão I de Israel e os bezerros de ouro

Em Israel, Jeroboão I instala dois centros de adoração cada um com um bezerro de ouro. Um em Dã outro em Betel (1 Reis 12:27-30).


Egipto invade e saqueia Judá

No século X, por volta de 930 a.C., o faraó Shoshenq I invade e pilha Judá. Roboão passa a ser vassalo do Egipto (1 Reis 14).

Abias de Judá, que sucedeu ao seu pai Roboão, por volta de 915 a.C., lança uma ofensiva contra Israel, cujo rei ainda era Jeroboão I (2 Crónicas 13).

Asa, neto de Roboão, defende-se de um exército etíope que atacou Judá já no fim do século X a.C., provavelmente às ordens do faraó Osorkon I (2 Crónicas 14).


Aram (Síria) torna-se potência dominante

Em Israel, Jeroboão I é sucedido por Nadabe, seu filho. Pouco depois, Baasa assassina Nadabe e toda a família real e toma o trono em 900 a.C., tendo o apoio de Aram (Síria), nomeadamente do rei Tabrimmon.

Baasa, ainda com a ajuda da Síria, tentou subjugar Judá tendo chegado ao ponto de cercar todo o território do rei Asa.

Entretanto, na Síria, por volta de 885 a.C., Tabrimmon é sucedido por Ben-Hadad I, seu filho.
Asa, rei de Judá, alia-se a Ben-Hadad I e convence este (pagando grandes somas em prata e ouro) a quebrar a aliança prévia com Israel. Assim, Asa conseguiu resistir aos ataques do rei Baasa de Israel (1 Reis 15).

Em Israel, Baasa é sucedido por Elá, seu filho. Após dois anos de reinado, Elá é assassinado por Zimri, general do exército. Zimri ocupa o trono mas suicida-se após apenas sete dias de reinado, sendo substituído por outro general, Omri.

Omri vence uma guerra civil e estabelece um reino forte em Israel, com capital na cidade de Samaria, por volta de 875 a.C.. Omri conquista Moabe para Israel e subjuga o rei Mesha durante 40 anos.

Acabe, filho de Omri, alia-se aos fenícios (também cananeus), casando com a princesa Jezebel de Sídon. Em Israel é instituída a adoração de Baal (mas este culto já era muito antigo em Canaã).

Acabe estabelece também uma aliança com Judá, casando a sua filha Atália com o filho do rei Jeosafat de Judá.

Entretanto, os sírios (sob Ben-Hadad II) tentam reaver o poder que detinham sobre Israel e cercam Samaria. Acabe negoceia um tratado com Ben-Hadad sobre comércio livre entre Damasco e Samaria (1 Reis 20).


A Estela de Tel Dan

Fragmentos de uma estela foram descobertos num sítio arqueológico do norte de Israel, Tel Dan. Foi esculpida a mando de um rei arameu contendo inscrições em aramaico, onde se comemorava uma vitória sobre um reino local, com os escritos "Rei de Israel" e "Casa de Davi". Não consta a autoria da escrita nesta estela, provavelmente foi o rei de Damasco, Hazael ou um de seus próprios filhos.

O texto é o seguinte:
[...] e cortou [...]
[...] meu pai subiu [contra ele quando] ele lutou em[....]
E meu pai deitou-se(morreu), e foi para seus [pais].
E o rei de I[s-]rael entrou previamente na terra de meu pai.
[E] Hadad me constituiu rei
E Hadad foi à minha frente [e] eu parti de [os] sete[...] do meu reino, e eu matei [sete]nta rei[s], que usavam milha[res de car]ros e milhares de cavaleiros (ou cavalos).
[Eu matei Jeo]rão filho de [Acabe] Rei de Israel, e eu matei [Acaz]ías, filhos de [Jeorão? re]i da Casa de Davi. E eu tornei [suas vilas em ruínas e tornei] sua terra em[desolação...] outro ...
[....e Jeú? tornou-se r]ei sobre Is[rael...e eu montei cerco] sobre


sábado, 23 de maio de 2015

Assírios e Babilónios (Parte 2) - Os Primórdios




Os Primórdios

Com origem em Canaã, os Hicsos foram à procura de aventuras militares no Egipto e acabaram por aí fundar uma dinastia semítica – a XV dinastia de reis egípcios que governou desde 1650 até 1550 a.C.

Os mais prestigiados cananeus foram, no entanto, os fenícios. Foram os que desenvolveram o comércio internacional no Mediterrâneo e criaram o alfabeto que foi a base da grafia de muitas línguas ocidentais dos três últimos milénios.

Em Ugarit (Ras Shamra, na parte mais a norte do território canaaneu) foi encontrada uma biblioteca de escritos em tábuas de argila de volta de 1300 a.C. Muita dessa literatura assemelha-se a textos do Antigo Testamento e alguma dela versa sobre o deus Baal. A língua ugarítica é da família das línguas semitas e a cultura é claramente canaaneia.

Os hebreus terão tido origem na família de etnias do sul de Canaã, com influência egípcia. No entanto sempre quiseram ver-se à parte das etnias canaaneias. Na Bíblia há uma compulsão por parte dos diversos autores para distinguir os hebreus e retratar os (outros) cananeus como sendo povos detestáveis (veja-se o caso de Jezebel, princesa fenícia). Isto é muito injusto, porque enquanto os fenícios desenvolviam uma avançada civilização marítima, os hebreus ainda se dedicavam a uma primitiva actividade pastorícia.


Tribos de hebreus

O grupo dos hebreus terá surgido por confluência de tribos com elevada afinidade entre si que terão coalescido em alianças de protecção contra inimigos comuns como, p.ex., os sírios (arameus), os árabes, os egípcios, os mesopotamicos, etc.

Lendas e contos épicos sobre uma origem comum reforçariam os laços dessas tribos. Por exemplo, a personificação das tribos como vários irmãos com um pai comum chamado Yakov (Jacob) ou Israel.

Uma carta enviada ao faraó Akenathen (1353–1336 AEC) refere um povo com o nome "Apiru" que provavelmente seriam os "Hebreus". 

Pensa-se que a Estela de Mernepta refere o nome "Israel" numa lista de povos derrotados pelo faraó Mernepta (1236-1223 AEC).


Reino Hebreu Unificado

A Bíblia fala de um reino, que a cronologia tradicional coloca entre os séculos XI e X AEC, unindo várias tribos, que teve os seguintes reis: Saúl e Isbosete da tribo de Benjamim; David e Salomão da tribo de Judá. A Bíblia é muito detalhada na descrição destes reis, mas a arqueologia tem pouco a dizer para confirmar.


A divisão: Judá e Israel (Efraim)

Segundo a Bíblia, a casa real e a elite do Reino Hebreu Unificado pertenciam às tribos de Judá e Benjamim. Medidas opressivas contra as outras tribos e um endividamento excessivo, no final do reinado de Salomão, lançaram as sementes para a divisão. Quando Roboão, filho de Salomão, já era rei, emissários das tribos oprimidas, liderados por Jeroboão, foram exigir melhores condições mas Roboão não só recusou como ainda piorou as condições. Por isso, ocorreu a secessão (ou divisão) do reino originando o Reino de Judá, ao sul, e o Reino de Israel no norte, sendo Jerusalém e Siquém as respectivas capitais. Jeroboão fez-se rei do norte de Israel e Roboão ficou rei de Judá.

É importante sublinhar que não existem evidências arqueológicas de um reino unificado nem dos primeiros reis dos dois reinos de Israel e Judá, pelo menos até ao século VIII AEC.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Assírios e Babilónios (Parte 1) - Introdução



Assírios e Babilónios

Num período de cerca de três séculos, Israel (ou Efraim) e Judá estiveram rodeados por impérios aos quais tiveram de se submeter ou resistir.

O império assírio e, depois, o império babilónico foram fontes de grandes preocupações para a identidade cultural dos hebreus. Grande parte da literatura do Antigo Testamento é um reflexo das dificuldades que os hebreus enfrentaram entre a opção de resistir ou a opção de submeter-se a estes dois impérios. Muitas vezes também o Egipto - outrora uma superpotência - entra em cena, neste período, agora no papel de potência secundária, ora como aliado dos hebreus ora como inimigo.

Estes impérios, o assírio e o babilónico, são, em rigor, ressurgimentos de impérios, mais antigos, do segundo milénio AEC. Para distinguir estes ressurgimentos face aos impérios mais antigos, os historiadores referem-nos como neo-assírio e neo-babilónico, respectivamente. O império neo-babilónico é também designado por império caldeu.

Comecemos por uma lista dos homens que comandaram estes dois poderosos impérios.

Reis assírios:
Período (AEC)
Rei
Descrição
912-891
Adad-Nirari II
-
891-884
Tukulti-Ninurta II
-
884-859
Ashurnasirpal II
-
859-824
Shalmaneser III
Suserano do rei Jeú de Israel.
824-811
Shamshi-Adad V
-
811-808
Shammuramat
Rainha regente - mãe de Adad-Nirari III
808-783
Adad-Nirari III
Poderá ter sido o "salvador" referido em 2 Reis 13:5 que livrou Israel da opressão da Síria.
783-773
Shalmaneser IV
-
773-755
Ashur-Dan III
-
755-745
Ashur-Nirari V
-
745-727
Tiglath-Pileser III
Em 734 acudiu ao rei Acaz de Judá para derrotar os reis de Israel (Efraim) e da Síria (Aram). Relançou o império assírio.
727-722
Shalmaneser V
Acabou com o reino de Israel, depondo o último rei, Oséias.
722-705
Sargão II
Destruiu Samaria e deportou a sua população, repovoando com pessoas oriundas de outros locais. 
705-681
Senaqueribe
Fez um cerco a Jerusalém porque Ezequias queria a independência
681-669
Esharhadon
Conquistou o Egipto e reforçou as fronteiras assírias.
669-631
Ashurbanipal
Destruiu Tebas, devido a uma insurreição dos egípcios.
Criou a biblioteca de Nínive, a qual foi encontrada, séculos mais tarde, nos escombros da cidade.
631-627
Ashur-etil-ilani

626
Sin-shumu-lishir

626-612
Sin-shar-ishkun
Queda de Nínive pela coligação medo-babilónica.


Reis babilónios:
Período (AEC)
Rei
Descrição
626-605
Nabopolassar
Tomou o império assírio abrindo caminho para o império caldeu.
604-562
Nabucodonosor II
Destruiu Jerusalém e deportou a elite judaica para Babilónia.
562-560
Amel-Marduk

560-556
Neriglissar

556
Labashi-Marduk

556-539
Nabonido
Derrotado por Ciro II da Pérsia.


Desde o século IX AEC que os assírios dominavam todo o médio-oriente, ameaçando e extorquindo pesados tributos aos reinos da região em troca de paz. O rei que não pagasse as somas exigidas era castigado com uma campanha militar por parte dos assírios.

Em 734 AEC, uma coligação formada por Israel (Efraim) e Síria (Aram) solicitou a Judá para se juntar numa rebelião contra a Assíria. O rei Acaz de Judá recusou-se a fazer parte dessa coligação e, por isso a coligação atacou Judá. Acaz pediu auxílio a Tiglath-Pileser III da Assíria o qual respondeu com uma campanha militar para arrasar Israel e a Síria.

Assim, os assírios destroçaram Israel, deportando e escravizando populações inteiras em condições sub-humanas, de tal modo que a identidade cultural dos antigos israelitas só ficou salvaguardada pelos que conseguiram refugiar-se a sul, no reino de Judá.

O reino de Judá continuou mais cem anos sob o domínio assírio, com reis obedientes ao império, com apenas alguns episódios de resistência ou rebelião (por exemplo, a rebelião de Ezequias em 701). Mas, por volta de 630, a Assíria encontrava-se em declínio, e o rei de Judá, Josias, aproveitou esta fraqueza para estender o seu poder para os antigos territórios de Israel.

Em 612 AEC, Nabopolassar da Babilónia destrói Nínive, a capital da Assíria.
Em 609, o faraó Necau II do Egipto, receando a ameaça de um novo império inimigo, decide aliar-se ao que restava do império assírio para combater os babilónios. Para isso, Necau teve de atravessar o território de Judá e Israel, encontrando a resistência de Josias. Neste combate, Josias acabou por morrer e Judá ficou temporariamente nas mãos dos egípcios.

Seguiram-se cerca de três décadas em que Judá ficou encurralado entre o Egipto e a Babilónia, até que Nabucodonosor decidiu pôr um fim a Jerusalém e deportar a elite judaica para Babilónia. Os judeus residiram aí durante cerca de setenta anos e aí construíram uma nova identidade.

Perto do fim do século VI AEC, os persas vieram destroçar o império babilónico e conquistaram a simpatia dos judeus exilados. Os judeus conseguiram um regresso a Jerusalém liderados por Zorobabel, um pretenso descendente de Josias, e construiram aquilo que viria a designar-se como Segundo Templo.


Israel e Judá

E quem eram os reis de de Israel e de Judá que, ora se submeteram, ora resistiram aos impérios?

Reis de Israel:
Período (AEC)
Rei
Descrição
869-850
Acabe
Filho de Omri. Casou-se com Jezebel, uma princesa fenícia. Foi morto em combate. A sua filha, Atália, tornou-se rainha de Judá.
850-849
Acazias
Filho de Acabe. Morreu em consequência de uma queda.
849-842
Jeorão
Filho de Acabe, irmão de Acazias. Assassinado por Jeú
842-815
Jeú
Matou Jezebel e toda a família real. Tributário de Salmaneser III da Assíria.
815-801
Jeoacaz
Filho de Jeú.
801-786
Joás
Filho de Jeoacaz.
786-746
Jeroboão II
O reino de Israel atingiu o máximo de poder.
746-745
Zacarias
Filho de Jeroboão II. Assassinado por Salum (Chalum).
745
Salum
Foi rei apenas um mês. Assassinado por Menahém.
745-738
Menahém
Pagou um elevado tributo ao rei assírio Tiglath-Pileser III para se manter no poder.
738-737
Pecaías
Filho de Menahém. Assassinado por Peca.
737-732
Pecá
Em coligação com a Síria (Aram), invadiu Judá, mas foi derrotado por Tiglath-Pileser III. Assassinado por Oséias.
732-724
Oséias
Rei fantoche colocado pelos assírios mas deposto por Salmaneser V.


Reis de Judá:

Período (AEC)
Rei
Notas
735-715
Acaz
Aliou-se aos assírios e tornou-se rei fantoche do imperador Tiglath-Pileser III.
715-687
Ezequias
Tributário de Senaqueribe da Assíria. Rebelou-se contra a Assíria em 701.
687-642
Manassés
Reinou 55 anos. Tributário de Esharadom e de Assurbanipal da Assíria.
642-640
Amom
Assassinado por servos.
640-609
Josias
Morreu numa batalha contra o faraó Necau II do Egipto. Três dos seus filhos foram reis de Judá.
609
Jeoacaz
(Salum)
Filho de Josias. Tinha 23 anos quando se tornou rei, e governou por poucos meses.
609-598
Jeoiaquim
(Eliaquim)
Filho de Josias. Tributário do faraó Necau II, mas depois da batalha de Carquemis, os babilónios tomaram o controlo.
598-597
Jeconias
(Joaquim)
Filho de Jeoiaquim. Jerusalém capturada pelos babilónios e este rei foi deposto em 597 AEC após poucos meses de reinado.
597-587
Zedequias
(Sedecias)
Filho de Josias. O último rei de Judá, sob domínio babilónio. Deposto. Jerusalém destruída.
Período de exílio na Babilónia (587 a 539)
(539)
(Zorobabel)
Neto de Jeconias. Não foi rei. Liderou um retorno dos israelitas a Jerusalém sob o domínio dos persas.


Mapas dos impérios

E agora vamos conferir os principais acontecimentos para podermos entender e enquadrar as crises desencadeadas pelo desentendimento entre os hebreus e os impérios viizinhos:

Período
AEC
Acontecimentos
920
Formam-se os reinos de Judá e Israel a partir de um decadente reino hebreu.

842-740
Em 842, Jeú mata a família de Acabe e torna-se rei de Israel, mas é vassalo dos assírios. Durante mais de cem anos os reis israelitas submetem-se aos assírios.

734
Efraim (Israel) e Aram (Síria) coligam-se para resistir contra a Assíria. Convidam Judá a juntar-se, mas Judá recusa-se e, por isso, os dois reinos atacam Judá.
O rei Acaz de Judá pede ajuda a Tiglath-Pileser III da Assíria. Tiglath destrói grande parte de Efraim e Aram. Acaz passa a pagar tributo aos assírios.

722
Sargão II destrói Samaria (capital de Efraim). Grande parte da população de Israel é deportada. Judá continua um reino vassalo da Assíria.

702
Ezequias, filho de Acaz, quer a independência de Judá e alia-se ao Egipto para resistir.

701
Senaqueribe cerca Jerusalém. Judá volta a submeter-se à Assíria.

670
O reino de Judá mantém-se graças ao pagamento de elevados tributos à Assíria; Israel já não existe; Assíria anexa o Egipto.

687-642
Manassés, filho de Ezequias, é tributário dos assírios

638
Egipto volta a ser independente da Assíria. Josias é rei de Judá.

612
Queda de Nínive – a coligação de babilónios e medos derrota os assírios

609
Necau II do Egipto tem a intenção de defrontar os babilónios. Josias, rei de Judá, resiste à passagem do exército egípcio pelo seu território e morre em batalha.

592
Os babilónios tomam o resto do império assírio. Nabucodonosor anexa o reino de Judá. A elite de Judá é deportada para a capital do império, Babilónia.

535
Ciro II da Pérsia toma babilónia. Deixa os judeus terem autonomia mas sem um reino próprio.

490
O império persa anexa o Egipto



Num próximo artigo vamos analisar como é que cada período deu origem a um conjunto de profetas:
-          crise assíria – Amós, Oseias, Isaías, Miqueias;
-          crise babilónica – Jeremias, Habacuque, Naum;
-          exílio em Babilónia - Ezequiel;
-          retorno a Jerusalém sob os persas – Ageu, Zacarias, Joel, Malaquias;