domingo, 3 de janeiro de 2021

Marcos: Jesus é uma personagem ridícula?

 



Evangelho de Marcos

Olhando atentamente para o evangelho de Marcos sem a contaminação dos outros evangelhos, que tentam criar uma história mais aceitável sobre Jesus, vemos que esta narrativa sobre Jesus retrata uma personagem demasiado ridícula para ser entendida como literal.



Quão ridículo pode ser Jesus?

Marcos foi o primeiro evangelho escrito. Os outros evangelhos seguiram-se: Mateus é baseado em grande parte no texto de MarcosLucas é baseado no texto de Mateus; João é baseado nos anteriores, mas utilizou pouco material destes, tendo inovado muito no texto. No fundo existiu um trabalho original sobre o evangelho de Jesus - hoje chamado Evangelho segundo Marcos - a partir do qual foram desenvolvidos outros trabalhos escritos.

Vamos, portanto, nos concentrar apenas no primeiro evangelho (que no Novo Testamento aparece em segundo lugar). Marcos claramente não foi escrito como uma descrição de acontecimentos. Se for lido com esse sentido, o Jesus de Marcos é uma personagem com traços ridículos e a sua narrativa tem apontamentos cómicos. Senão vejamos:
 - Jesus diz que a sua mensagem deve ser mantida secreta, apesar de a apresentar perante milhares de pessoas; 
 - Jesus tem atitude racista perante uma mulher fenícia... na Fenícia;  
 - Jesus cospe na língua e ouvidos de um surdo-mudo e nos olhos de um cego; 
 - depois de muita exposição pública, Jesus admite que ninguém sabe quem ele é, deixando que o público acredite que ele é João Baptista ou outro profeta antigo qualquer; 
 - Jesus irrita-se com uma figueira, porque não tinha figos... fora da época dos figos;  
 - quando Jesus é detido, um jovem misterioso que estava com ele foge nú;  
 - Jesus morre decepcionado com Deus.


Se Marcos reflecte a vida de uma personagem histórica chamada Jesus, então esta personagem seria demasiado estranha para ser objecto de devoção por seguidores.


Jesus é líder de culto secreto

Quando Jesus é inquirido sobre o porquê de uma parábola complicada, em Marcos, Jesus explica que é necessário manter em segredo o reino de Deus, pois é só para alguns fiéis salvarem-se. Ou seja, as parábolas eram deliberadamente ininteligíveis para impedir “os de fora” de se salvarem caso tomassem conhecimento do “reino de Deus”!
Marcos 4:10-12 Quando se achou só, os que estavam ao redor dele, com os doze, interrogaram-no acerca da parábola. E ele lhes disse: A vós é confiado o mistério do reino de Deus, mas aos de fora tudo se lhes diz por parábolas; para que vendo, vejam, e não percebam; e ouvindo, ouçam, e não entendam; para que não se convertam e sejam perdoados.


É claro que, com isto, o autor de Marcos estava mesmo a explicar aos leitores que o seu texto é muito complexo e destina-se a ser entendido apenas pelos membros da sua comunidade chegada. Não estava certamente a dizer que o Cristo, o Filho de Deus, seria tão perverso que só pretendia salvar um conjunto muito limitado de pessoas.

Quem mais tarde tentou ler Marcos como uma biografia simples de Jesus cometeu o erro monumental que levou o cristianismo tornar-se o que é hoje.


Jesus é racista, descrimina uma mulher estrangeira

Num episódio sobre uma mulher grega, descrita como sendo de origem síria e fenícia, que pede ajuda a Jesus e que este recusa-se inicialmente, argumentando que “primeiro tem de alimentar as crianças, só depois os cães”, Marcos coloca na personagem de Jesus uma importante característica dos judeus do Antigo Testamento: a discriminação étnica.

Marcos 7:24-30 Levantando-se dali, foi para as regiões de Tiro e Sídon. E entrando numa casa, não queria que ninguém o soubesse, mas não pôde ocultar-se; porque logo, certa mulher, cuja filha estava possessa de um espírito imundo, ouvindo falar dele, veio e prostrou-se-lhe aos pés; ora, a mulher era grega, de origem siro-fenícia e rogava-lhe que expulsasse de sua filha o demônio. Respondeu-lhes Jesus: Deixa que primeiro se fartem os filhos; porque não é bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos

Neste episódio, Jesus considera uma mulher estrangeira e a sua filha como seres inferiores equivalentes a cães. Se for entendido literalmente, é um episódio em que Jesus pratica descaradamente discriminação étnica ou racismo.

Ainda mais desconcertante neste episódio é que Jesus pratica o racismo contra uma mulher fenícia... na Fenícia (Tiro e Sídon eram cidades da Fenícia)!


Cuspir não é bonito

Será que já foi realizado algum filme onde Jesus cospe na cara de um doente para o curar? Não é provável... pois não ficaria um take muito elegante.
Marcos 7:32-34 E trouxeram-lhe um surdo, que falava dificilmente; e rogaram-lhe que pusesse a mão sobre ele. Jesus, pois, tirou-o de entre a multidão, à parte, meteu-lhe os dedos nos ouvidos e, cuspindo, tocou-lhe na língua; e erguendo os olhos ao céu, suspirou e disse-lhe: Efatá; isto é Abre-te.

Marcos 8:22-25 Então chegaram a Betsaída. E trouxeram-lhe um cego, e rogaram-lhe que o tocasse. Jesus, pois, tomou o cego pela mão, e o levou para fora da aldeia; e cuspindo-lhe nos olhos, e impondo-lhe as mãos, perguntou-lhe: Vês alguma coisa? E, levantando ele os olhos, disse: Estou vendo os homens; porque como árvores os vejo andando. Então tornou a pôr-lhe as mãos sobre os olhos; e ele, olhando atentamente, ficou restabelecido, pois já via nitidamente todas as coisas.

Porquê cuspir, se Jesus poderia levantar simplesmente a mão ou apenas tocar no seu paciente para o curar? E a segunda passagem seria duplamente embaraçosa porque Jesus, para além de cuspir no seu paciente, não conseguiu os resultados pretendidos à primeira tentativa pois necessitou de dois rounds de terapia para curar o cego.

Parece que o autor de Marcos faz questão de retratar Jesus como um curandeiro que usa métodos repulsivos. Por outro lado, é de notar que Jesus não quer testemunhas para os seus milagres ("tirou-o de entre a multidão" e "levou-o para fora da aldeia"), o que leva a concluir que o autor de Marcos estaria a contrariar a vontade de Jesus de que estas suas actividades não fossem conhecidas.

Podemos admitir, por outro lado, que o autor de Marcos pode ter-se inspirado em relatos fantasiosos sobre curas miraculosas praticadas por Vespasiano e que Jesus nunca fez nenhuma cura com cuspo.


Jesus é João Baptista

Segundo Marcos, as pessoas que viam Jesus pensavam que ele era João BaptistaElias ou qualquer outro profeta antigo:
Marcos 8:27-30 ... e no caminho interrogou os discípulos, dizendo:
 - Quem dizem os homens que eu sou?
Responderam-lhe eles:
 - Uns dizem: João, o Batista; outros: Elias; e ainda outros: Algum dos profetas.
Então lhes perguntou:
 - Mas vós, quem dizeis que eu sou?
Respondendo, Pedro lhe disse:
 - Tu és o Cristo.
E ordenou-lhes Jesus que a ninguém dissessem aquilo a respeito dele.


Nesta passagem de Marcos, Jesus prefere que as pessoas continuem a pensar que ele é João Baptista ou outro profeta ressuscitado, a deixá-los saber que ele é uma outra pessoa. Pedro não ajuda muito, pois simplesmente atribui-lhe um título sem o identificar como uma pessoa diferente de João Baptista.

Se havia pessoas que pensavam que Jesus era João Baptista é porque, em primeiro lugar, estes dois nunca foram vistos juntos e, em segundo lugar, havia pessoas que sabiam que João Baptista existia mas não sabiam nada sobre Jesus.


Jesus irrita-se com uma figueira

Num episódio que envolve uma figueira, Jesus irritou-se e amaldiçoou uma figueira por esta não ter figos... fora da época dos figos!

Marcos 11:12-21 No dia seguinte, depois de saírem de Betânia teve fome, e avistando de longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se, porventura, acharia nela alguma coisa; e chegando a ela, nada achou senão folhas, porque não era tempo de figos. E Jesus, falando, disse à figueira: Nunca mais coma alguém fruto de ti. E seus discípulos ouviram isso. ...
Quando passavam na manhã seguinte, viram que a figueira tinha secado desde as raízes. Então Pedro, lembrando-se, disse-lhe: Olha, Mestre, secou-se a figueira que amaldiçoaste.


Esta passagem de Marcos é uma parábola sobre o Templo de Jerusalém. O Templo de Jerusalém "secou" no ano 70 EC, quando o exército romano o incendiou.

Será que o autor de Marcos fez questão de acrescentar "porque não era tempo de figos" para mostrar o quão ridículo Jesus poderia ser?


O rapaz vai nú!

Jesus, quando foi detido, estava a ser seguido por um jovem que se cobria apenas com um lençol. Os homens que prenderam Jesus tentaram agarrar este misterioso jovem, mas ele fugiu despido, deixando o lençol para trás.

Marcos 14:51-52 Ora, seguia-o certo jovem envolto em um lençol sobre o corpo nu; e o agarraram. Mas ele, largando o lençol, fugiu despido.


Não se percebe a relevância ou contributo deste episódio para a história de Jesus. Parece apenas uma cena cómica... ou uma alegoria.


Jesus morre desapontado com Deus

Parece que o autor de Marcos quis retratar Jesus como um Messias que morre decepcionado com Deus ao verificar que estava a morrer preso a uma cruz e que nada de espantoso sucedia.
Marcos 15:33-34
houve trevas sobre toda a terra, do meio-dia às três horas da tarde. Por volta das três horas da tarde, Jesus bradou em alta voz: “Eloí, Eloí, lamá sabactâni?”, que significa “Meu Deus! Meu Deus! Por que me abandonaste?”


Este desfecho parece ser inspirado nos mistérios de Rómulo, em que um homem que vê Rómulo, após a morte deste, diz-lhe "porque nos abandonaste?".



Fonte para os episódios da Paixão de Cristo

Para os episódios que conduzem à crucificação de Jesus, o autor de Marcos provavelmente recorreu a uma personagem chamada Jesus filho de Ananias, que ficou conhecida em Jerusalém entre 62 e 69 EC, muitos anos após a suposta crucificação de Jesus da Nazaré. O historiador Josefo referiu esta personagem na sua obra Guerra dos Judeus (livro VI, 5, 3), publicada por volta de 75 EC.

As semelhanças entre a narrativa em Marcos quando comparada com a narrativa de Josefo, são as seguintes:


Jesus, segundo Marcos
Jesus, filho de Ananias
Enquadramento
Prefeitura de Pilatus (26 a 36 EC)
Prefeitura de Albinus (62 a 64 EC)
Nome
Jesus
Jesus
Veio a Jerusalém durante uma grande festividade
Sim
Sim
Gritou no Templo
Sim
Profetizou a destruição de Jerusalém
Sim
Sim
Foi detido
Sim
Foi açoitado pelos judeus
Sim
Sim
Foi açoitado pelos romanos
Sim
Sim
Foi julgado pela autoridade romana
Sim (prefeito Pilatos)
Sim (prefeito Albino)
Foi condenado pela autoridade romana
Não
Não
Data da morte
69 EC
Causa da morte
Pedra de balista (catapulta)


Seria muita coincidência que tenham existido duas personagem com histórias tão semelhantes num intervalo de 35 anos.


Conclusão

Marcos é uma grande parábola e Jesus é uma personagem alegórica dessa grande parábola. A personagem que serviu de base a muitos dos episódios de Jesus ficou conhecida entre 62 e 69 EC e chamava-se Jesus ben Ananias.

O autor de Marcos fez questão de retratar um Jesus bizarro demais para ter a certeza que os seus leitores iriam perceber que não se trata da biografia de alguém.

Jesus da Nazaré existiu? Provavelmente não. Os outros três evangelhos do Novo Testamento, Mateus, Lucas e João, foram construídos a partir da narrativa de Marcos, por isso não oferecem provas adicionais sobre a possível existência de Jesus da Nazaré.



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