sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Século I - Tito Lívio e Plutarco - deificação de Rómulus






Rómulo ou Rómulus, segundo as lendas romanas, foi o fundador e primeiro rei de Roma. É claramente uma personagem mitológica.

A des­cri­ção da morte de Rómu­lus, segundo dois his­to­ri­a­do­res roma­nos do século I — Tito Lívio e Plu­tarco — pode reve­lar algu­mas pis­tas sobre as influên­cias que esti­ve­ram na ori­gem das nar­ra­ti­vas sobre a morte, res­su­rei­ção, ascen­são e apa­ri­ções de Jesus.

  • Rómu­lus desa­pa­rece, dei­xando o trono vago
  • O céu escureceu no dia em que Rómulus desapareceu
  • Exis­tem sus­pei­tas que os pode­ro­sos de Roma mata­ram Rómu­lus por este ser incómodo
  • O povo alega que Rómu­lus subiu ao céu e tornou-se Deus (Quirinius)
  • Um homem alega ter visto Rómu­lus e rece­bido reve­la­ções dele sobre o futuro

Ape­sar de Rómu­lus ser uma personagem mítica que ale­ga­da­mente teria vivido uns 700 anos antes, era assim que a sua morte era retra­tada no século I — o século em que come­ça­ram a ser escri­tos os evan­ge­lhos sobre Jesus.


Tito Lívio (59 a.C. — 17 d.C.)

Tito Lívio foi o autor da obra histórica intitulada Ab urbe condita ("Desde a fundação da cidade"), onde tenta relatar a história de Roma desde o momento tradicional da sua fundação em 753 a.C. até ao início do século I d.C., referindo desde os primeiros reis de Roma.

Tito Lívio descreve a morte de Rómulus — o mítico funda­dor de Roma e seu primeiro rei — e a sua ascensão aos céus.

Descreve tam­bém como Rómulus foi visto por Próculus e as revela­ções que este obteve sobre o futuro dos romanos. Este Próculus fica a saber, com muitos séculos de antecedência, que Roma haveria de ter grandes glórias.
Tito Lívio (59 a.C. - 17 d.C.), “Ab Urbe Con­dita” (Desde a Fun­da­ção da Cidade ou His­tó­ria Pri­mi­tiva de Roma), Livro 1, cap 16 
Rómu­lus ajun­tou o seu exér­cito na Caprae Palus do Cam­pus Mar­tius. Uma violenta tempes­tade surgiu e envolveu o rei numa nuvem tão densa que ele se tor­nou invi­sí­vel aos que esta­vam pre­sen­tes. A par­tir daquela hora Rómu­lus dei­xou de ser visto na Terra. 
Quan­do a juven­tude romana teve os seus temo­res afas­ta­dos pelo retorno do bri­lho do sol, veri­fi­ca­ram que o trono estava vago. Ape­sar de acre­di­ta­rem ple­na­mente nos sena­do­res, que afir­ma­ram que ele [Rómu­lus] havia sido arre­ba­tado ao céu num rede­moi­nho, fica­ram mudos por algum tempo, pois viram-se repen­ti­na­mente de luto. 
Em seguida, algu­mas vozes come­ça­ram a pro­cla­mar a divin­dade de Rómu­lus; o cla­mor foi subindo; e, final­mente, todos o sau­da­ram como um deus e filho de um deus, e reza­ram para que ele fosse sem­pre gen­til e pro­te­gesse os seus filhos. 
No entanto, mesmo nesta gran­di­osa época, havia, creio eu, alguns dis­si­den­tes que man­ti­ve­ram secre­ta­mente que o rei [Rómu­lus] tinha sido feito em peda­ços pelos sena­do­res. Esta indigna ver­são da sua morte foi pas­sando, vela­da­mente, mas não era tão impor­tante como o temor e admi­ra­ção pela gran­deza de Rómulus. 
Mas esta ver­são sobre a sua morte foi defi­ni­ti­va­mente aban­do­nada em favor da ver­são da divin­dade de Rómu­lus, pela opor­tuna acção de um deter­mi­nado homem, Julius Pró­culus, céle­bre pelos seus sábios con­se­lhos sobre gran­des questões. 
A perda do rei tinha dei­xado as pes­soas inqui­e­tas e des­con­fi­a­das dos sena­do­res. Próculus, consciente do temperamento predominante, concebeu a idéia astuta de abordar a Assembleia. 
- “Romanos! Ao amanhecer de hoje, o Pai desta Cidade desceu subitamente do céu e apareceu-me. Enquanto, emocionado de admiração, fiquei extasiado diante dele com a mais profunda reverência, rezando para que pudesse ser perdoado por contemplá-lo. «Vai», disse ele, «e diz aos romanos que, pela vontade dos céus, Roma liderará o mundo. Deixa-os aprender a serem soldados. Deixa-os saber e ensinar os seus filhos, que nenhum poder na terra poderá vencer armas romanas».” 
Refe­rên­cia: http://www.perseus.tufts.edu/hopper/text?doc=Perseus%3Atext%3A1999.02.0026%3Abook%3D1%3Achapter%3D16


Plu­tarco (46 — 120 d.C.)

Plutarco (Lucius Mestrius Plutarchus, nome romano) foi um historiador, biógrafo, ensaísta e filósofo grego, que se tornou cidadão romano.

Também escreveu sobre Rómulus, mas pode ter baseado a sua versão na anterior obra de Tito Lívio.

Plu­tarco (cerca 46 — 120 d.C.) — “Vida de Numa Pompilius” 
Foi o tri­gé­simo sétimo ano, contado a par­tir da fun­dação de Roma, quando Rómulus, então reinante, no quinto dia do mês de Julho, festejou os Nonae Caprütīnae, oferecendo um sacrifício público no Caprae Palus, na presença do senado e do povo de Roma. De repente, o céu escureceu, uma espessa nuvem de tempestade e chuva envolveu a terra, as pessoas fugiram em aflição, e foram dispersas, e neste turbilhão Rómulus desapareceu, e o seu corpo nunca foi encontrado vivo ou morto. 
A sus­peita recaiu sobre os patrí­cios, e os boa­tos eram cor­ren­tes entre as pes­soas como se, can­sa­dos da monar­quia e do com­por­ta­mento arro­gante de Rómulus em rela­ção a eles, tinham inten­tado con­tra a sua vida, de modo que eles pudes­sem assu­mir o governo nas suas pró­prias mãos. Esta sus­peita que pro­cu­ra­vam des­viar decre­tando hon­ras divi­nas para Rómulus, como se este não esti­vesse morto mas sim numa con­di­ção supe­rior. E Pró­cu­lus, um homem de nota, jurou que viu Rómulus arre­ba­tado aos céus com suas armas e para­men­tos, e ouviu-o cla­mar que eles deve­riam agora chamá-lo pelo nome de Qui­ri­nus [divindade que repre­senta o povo de Roma]. 
Refe­rên­cia: http://classics.mit.edu/Plutarch/numa_pom.html 


A lenda de Romulus e Remus 

Romulus e o seu irmão gémeo, Remus, eram filhos do deus Marte e da princesa Rhea Silvia. Através da linhagem materna, os gémeos eram descendentes do herói troiano Eneias e de Latinus, o fundador mítico do reino do Lácio (ou da Lázio, ou Latium).

Antes do nascimento dos gémeos, o rei Numitor, pai de Rhea, foi usurpado pelo seu irmão, Amulius. Depois de apoderar-se do trono, Amulius assassinou o filho de Numitor e condenou Rhea à virgindade perpétua, consagrando-a como Vestal. Rhea, no entanto, engravidou pelo deus Marte. Amúrio mantinha-a encarcerada e, no nascimento dos gémeos, ordenou que estes fossem afogados no rio Tiber. Em vez de cumprir as ordens do rei, seus criados deixaram os gémeos a salvo na margem do rio, no sopé da colina Palatina.

Uma loba aproximou-se dos gémeos e os levou para uma caverna, onde os amamentou e cuidou deles, até que foram encontrados pelo pastor Faustulus e sua esposa, Acca Larentia. Os irmãos cresceram entre os pastores e as pessoas da colina Palatina.

Depois de se envolverem num conflito entre os seguidores de Amúrio e os de seu avô Numitor, eles aprenderam a verdade de sua origem. Mataram Amulius e restauraram Numitor no trono.

Os gémeos concordaram em estabelecer a sua própria cidade e escolheram as colinas com vista para o Tibre, o local onde eles haviam sido abandonados em bebés. Entretanto, numa desavença, Remus foi morto por seu irmão Rómulus. Rómulus fundou Roma sem o seu irmão.


O Evangelho de Rómulo segundo Plutarco

Na verdade, Plutarco deixou-nos uma biografia completa de Rómulo. Não foi só sobre a sua ascensão ao céu.

Esta biografia de Rómulo não foi inventada por Plutarco, mas ele colocou por escrito as histórias tradicionais sobre Rómulo. Tal como já o seria para Tito Lívio, esta história seria já antiga no tempo em que Plutarco escreve (por volta de 75 EC) porque ele refere-se as umas cerimónias públicas anuais que celebravam o dia em que Rómulo ascendeu ao céu e que seriam uma tradição em Roma.

Plutarco conta que Rómulo era filho de um Deus e de uma virgem; que houve uma tentativa para o matar enquanto criança; que foi salvo e criado por uma família pobre, tornando-se um humilde pastor; depois, como homem, é amado pelo povo, aclamado como rei e morto pela elite conivente; finalmente ressuscita dos mortos, aparece a um amigo para contar as boas novas ao seu povo e sobe ao céu para governar do alto.

Sobre a aparição de Rómulo, Plutarco conta este detalhe:

Plu­tarco (cerca 46 — 120 d.C.) — “Rómulo” 
Estando nesta desordem, um dos patrícios, dizem eles, de família nobre e de bom e aprovado caráter, amigo fiel e familiar do próprio Rómulo, vindo com ele de Alba, de nome Júlio Próculo, apresentou-se no fórum; e, fazendo um juramento sagrado, protestou diante de todos, que, enquanto estava viajando na estrada, ele vira Rómulo vindo ao seu encontro, parecendo mais alto e mais bonito do que nunca, vestido com uma armadura brilhante e flamejante; e ele, ficando apavorado com a aparição, disse: "Por que, ó rei, ou com que propósito tu nos abandonaste a rumores injustos e perversos, e a cidade inteira ao luto e tristeza sem fim?" e que ele respondeu: "Agradou aos deuses, ó Próculo, que nós, que viemos deles, permanecêssemos tanto tempo entre os homens como o fizemos; e, tendo construído uma cidade para ser a maior do mundo para o império e glória, devemos retornar novamente ao céu. Mas, adeus; e diz aos romanos, que, pelo exercício da temperança e força, eles atingirão o auge do poder humano; nós seremos para vocês o deus propício Quirino." ...

Referência: http://classics.mit.edu/Plutarch/romulus.html 


Nesta versão mais detalhada, Próculo pergunta a Rómulo "Por que nos abandonaste?" ao que Rómulo responde que tinha sido um deus o tempo todo, mas tinha descido à terra com o propósito de trazer glória aos romanos, e agora tinha que retornar para sua casa no céu.


O Evangelho de Jesus segundo Marcos

É obvio que o autor do evangelho de Marcos usou as ideias que já se celebravam no culto de Rómulo para escrever sobre a morte de Jesus. Com a diferença de que o corpo de Jesus desaparece ao terceiro dia em vez de imediatamente como no caso de Rómulo. Recordemos a narrativa sobre o momento da morte de Jesus após a crucificação:

Marcos 15:33-34
E houve trevas sobre toda a terra, do meio-dia às três horas da tarde. Por volta das três horas da tarde, Jesus bradou em alta voz: “Eloí, Eloí, lamá sabactâni?”, que significa “Meu Deus! Meu Deus! Por que me abandonaste?”


Este autor quis atribuir a Jesus as palavras "por que me abandonaste" mas alegando que Jesus as pronunciou em aramaico, para disfarçar a colagem ao mito de Rómulo e para usar um Salmo do Antigo Testamento para a cena da crucificação.


Conclusão

Os romanos já eram cristãos antes de Jesus. A diferença é que o Cristo deles chamava-se Rómulo e não Jesus.

Rómulo existiu? Nenhum historiador reconhece isso! Então por que Jesus existiu, se toda a narrativa sobre a sua vida é uma ficção composta de peças anteriores de literatura (Antigo Testamento e textos greco-romanos)?



2 comentários:

  1. O destino normal de um ser vivo é ir para junto de Hades, que vive debaixo da terra. Alguns seres notáveis, contudo, em vez de descerem sobem para junto de Zeus. Isso aconteceu, por exemplo, com Hércules. Zeus veio buscar a sua parte divina. Há uma tragédia que conta esta história - As Traquínias de Sofocles.

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    1. O mais notável desta narrativa de Tito Lívio é que Rómulus é uma personagem mitológica. Muito provavelmente Lívio sabia-o mas isso não o impediu de narrar a vida de Rómulo como se se tratasse de uma personagem histórica.

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