domingo, 27 de janeiro de 2013

Actos dos Apóstolos - Anacronismo, Teletransporte





Anacronismo - Judas Galileu depois de Teudas?

Em Actos relata-se que, pouco tempo depois da crucificação de Jesus, os apóstolos começaram a ser perseguidos e detidos pelas suas actividades proselitistas.

Quando estava reunido o Sinédrio para decidirem o que fazer dos apóstolos detidos no Templo, o famoso sábio Rabi Gamaliel fez um discurso para apelar à cautela do Tribunal:
Actos 5:34-38 ... acautelai-vos a respeito do que estai para fazer a estes homens. Porque, há algum tempo, levantou-se Teudas, dizendo ser alguém; ao qual se ajuntaram uns quatrocentos homens; mas ele foi morto, e todos quantos lhe obedeciam foram dispersos e reduzidos a nada. Depois dele levantou-se Judas, o galileu, nos dias do recenseamento, e levou muitos após si; mas também este pereceu, e todos quantos lhe obedeciam foram dispersos.

A questão a considerar aqui é o anacronismo das declarações de Gamaliel, porque coloca Judas Galileu depois de Teudas. No entanto a cronologia geralmente aceite, segundo as crónicas de Flávio Josefo, é a seguinte:
-          Judas Galileu liderou uma revolta contra os romanos, no tempo do censo de Quirinius (6 EC);

-          Teudas liderou um conjunto de rebeldes durante a perfeitura de Cuspius Fadus (44 - 46 EC).


Um sábio como Gamaliel não faria um erro destes - trocar a ordem de dois eventos históricos separados por quarenta anos.

Por outro lado, o episódio do aprisionamento dos apóstolos, a ser verdadeiro, deveria ter ocorrido por volta da década de 30, antes do episódio de Teudas. Como é que Gamaliel fala de um evento que ainda não tinha ocorrido?

Quem é responsável por estes erros? Foi, claro, o autor de Actos dos Apóstolos, pois escreveu muito mais de 100 anos após o episódio de Teudas. Muitos apontam cerca de 180 EC como a data de escrita - nesta altura, os episódios de Judas Galileu e de Teudas eram já acontecimentos remotos.



Filipe e o Etíope - teletransporte

O autor de Actos certamente tinha também conhecimento do florescimento de uma forma de cristianismo na Etiópia (hoje designado de cristianismo copta), e também quis “explicar” este fenómeno pela intervenção de Filipe, um apóstolo dos evangelhos:
Actos 8:26-40 Mas um anjo do Senhor falou a Filipe, dizendo: Levanta-te, e vai em direção do sul pelo caminho que desce de Jerusalém a Gaza, o qual está deserto. E levantou-se e foi; e eis que um etíope, eunuco, mordomo-mor de Candace, rainha dos etíopes, o qual era superintendente de todos os seus tesouros e tinha ido a Jerusalém para adorar, regressava e, sentado no seu carro, lia o profeta Isaías. Disse o Espírito a Filipe: Chega-te e ajunta-te a esse carro. ... E indo eles caminhando, chegaram a um lugar onde havia água, e disse o eunuco: Eis aqui água; que impede que eu seja batizado? [...] mandou parar o carro, e desceram ambos à água, tanto Filipe como o eunuco, e Filipe o batizou. Quando saíram da água, o Espírito do Senhor arrebatou a Filipe, e não o viu mais o eunuco, que jubiloso seguia o seu caminho. ...

O objectivo do autor era criar a noção de que na origem dos cultos cristãos estavam os apóstolos. Neste caso temos Filipe a passar a fé a um etíope que ia de regresso a casa.

Incidentalmente, o episódio termina com um tom cómico: Filipe foi depois tele-transportado por um espírito para Azoto (Asdode), uma cidade a quilómetros de distância.


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